Um novo capítulo da crise do leite no Vale do Taquari foi escrito na tarde desta segunda-feira (23), durante reunião na Câmara de Vereadores de Lajeado convocada pela Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural da Câmara Federal e pelo Grupo de Trabalho a Respeito da Importação do Leite em Pó do Uruguai na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul. Sindicalistas, produtores, prefeitos, vices, vereadores e secretários de agricultura participaram.
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O momento foi destinado à unificação dos problemas enfrentados desde 2016 pela categoria. Nos últimos anos, de acordo com levantamentos da Emater/RS-Ascar, cerca de 24 mil agricultores deixaram a produção de leite no estado. Desses, estima-se que 1,2 mil sejam do Vale do Taquari. Esse resultado prejudica não só os trabalhadores, mas a economia, que acaba sendo atingida pela mudança de comportamento desse grupo.
São três eixos que puxam as perdas do setor: importação do leite do Uruguai, queda da produção e diminuição do volume de leite exportado pelo Brasil. Somando-se ao problema, está o endividamento com os bancos, fruto de investimentos nas propriedades. Integrante de um grupo que discute a crise do setor, a presidente do Conselho de Desenvolvimento do Vale do Taquari (Codevat), Cíntia Agostini, fala do contexto regional.
“Somos precursores nesse debate e das preocupações que se espalharam pelo estado e pelo país. Precursores porque temos a terceira maior bacia leiteira do estado e porque um terço de leite produzido nos municípios gaúchos é oriundo da região. Por isso o nosso envolvimento na causa”. O Codevat apresentou um documento com as preocupações. “Não podemos mais dizer o que será feito. Precisamos agir”, diz ela.
Seguindo o posicionamento adotado pelo Codevat, o coordenador regional do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), Lari Hofstetter, apresentou uma série de sugestões a ser entregue aos governos estadual e federal. Entre elas, estabelecer um preço mínimo do litro do leite e postergar as dívidas com os bancos. Apenas o Banco do Brasil ofereceu parcelamento dos empréstimos aos produtores.
Presente na reunião, o representante do Ministério da Pecuária e Abastecimento (Mapa), Roberto Lucena, falou sobre os programas que estão sendo desenvolvidos nas propriedades do país. A falta de apontamentos voltados à crise do leite provocou questionamentos da plateia, sendo que alguns não puderam ser respondidos.
Os agricultores
Produtor de leite em Estrela, e secretário da Agricultura no município, José Adão Braun definiu a atual situação da classe como uma tragédia. Ele pediu celeridade em ações para combater os problemas do campo. “Nunca vi uma crise tão prolongada e tão grave como essa. O diagnóstico foi feito há dois anos. Todo mundo sabe o que deve ser feito para combatê-la, mas de objetivo muito pouco tem acontecido”.
Também ligado à produção de leite, mas no município de Arroio do Meio, Paulo Grassi convocou uma mobilização da categoria. Para ele, que é vice-presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR) de Arroio do Meio, a multinacional Lactalis tem efetiva parcela de culpa nas dificuldades dos produtores de leite.
“A crise é uma consequência da vinda da Lactalis. É a culpada disso. O governo do Estado patrocinou a vinda dessa empresa e o federal faz vistas grossas, porque as atenções estão voltadas apenas para a soja”, diz. Grassi é um dos pioneiros desse debate no Vale do Taquari, com propostas para enfrentar as dificuldades e engajamento com diversos municípios. Apesar disso, ele teme que esses movimentos não tenham resultados por conta da falta de apoio político.
Encaminhamentos
O encontro sobre o leite, que propôs diagnóstico e alternativas à crise, foi convocado pelos deputados Elvino Bohn Gass (PT), da Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural da Câmara Federal, por meio da Subcomissão do Leite, e Zé Nunes (PT), do Grupo de Trabalho a Respeito da Importação do Leite em Pó do Uruguai, das comissões de Agricultura, Pecuária e Cooperativismo e Economia, Desenvolvimento Sustentável e de Turismo, da Assembleia Legislativa.
Ambos se comprometeram em levar a discussão adiante. Nunes disse que vai pedir o apoio dos deputados gaúchos na assinatura de um documento pedindo uma audiência com o governador José Ivo Sartori. Já Bohn Gass quer reunir as bancadas gaúchas na Câmara e no Senado para discutir o tema.
Esse foi o primeiro encontro da comissão federal no Rio Grande do Sul. O Vale do Taquari foi escolhido por conta da sua dependência econômica da agricultura e, consequentemente, da atividade leiteira. NR