Durante a pandemia criamos demandas domésticas que antes nem víamos

Confira o comentário da jornalista, psicóloga, psicanalista clínica Dirce Becker Delwing.


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Foto: Ilustrativa

Desde que começou a pandemia, meu esposo tem investido em serviços de manutenção da casa. Não passa uma semana sem que ele encontre alguma coisa para ajeitar. Você pode estar pensando que devia ter mesmo muita coisa estragada. Afinal, estamos em casa desde o começo de abril, ou seja, já são mais de 20 semanas. Reconheço que tenho apreciado todas as melhorias, mas, ontem, pensei com ele sobre o quanto não se enxerga um fim para os pequenos consertos. Tudo começou com a colocação de uma calha no canil, depois migrou para colocação de tela nas chaminés, indo para a instalação de um fogão à lenha, seguindo para a pintura do muro. Depois, o replantio de grama no jardim, a pintura de uma porta interna e assim por diante.


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O mais engraçado é que também tenho tido olhos que vasculham os desalinhos, não na casa, mas na cozinha. Com a grana mais curta, já sentindo os efeitos da pandemia, deu para comprar algumas frigideiras pela internet. Fiquei faceira. Sou daquelas donas de casa que se alegram até com um pote de plástico novo. Juro por Deus, me esforço para fazer vistas grossas diante da vontade de trocar utensílios domésticos, roupas de cama e jogos de toalha. Parece que tudo deu para estar com a validade vencida, ou fiquei mais crítica do que era quando tinha uma rotina com a agenda preenchida.

É interessante pensar que conseguimos criar demandas que antes nem víamos e necessidades de consumo que poderiam passar despercebidas se não fosse o fato de, neste momento, estarmos mais em casa. Acontece que, antes da pandemia, muita gente saía de manhã e voltava à noite. Com a obrigatoriedade de permanecer em casa, a pessoa começa a perceber falhas, o que pode ser muito interessante e produtivo. Mas, é também prudente pensar que sempre vai aparecer um novo estrago, uma nova rachadura e que não podemos nos tornar escravos de tais demandas.

Isso vale também para a arrumação da casa. O poeta Fabrício Carpinejar escreveu outro dia que, no início da pandemia, passava os dias fazendo limpeza. Ele disse que, lá pelas tantas, aprendeu a deixar a casa em paz porque não aguentava mais a sua exigência pela perfeição. Ele viu que nunca tudo estaria limpo e que, se seguisse assim, passaria os dias fazendo faxina. “Não que eu tenha me tornado desleixado. Eu só me preocupo menos”, escreveu.

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