O ex-menino de rua que guia turistas

Na reflexão desta sexta-feira (28), a jornalista, psicóloga e psicanalista clínica Dirce Becker Delwing conta lições que teve em Olinda, durante suas férias


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Imagem de Olinda (Foto: TAP/Reprodução)

Sempre quando estou em férias, me deparo com pessoas interessantes que mereceriam ter a sua história contada num livro, num filme, numa novela. Ontem foi o dia de conhecer Antônio Jorge Barbosa, o “Lord”. Encontrei ele na Rua São Bento, em Olinda. Estava procurando a casa de Alceu Valença. Tinha lido uma notícia que falava da vida pessoal do cantor e referia que ele mantém a antiga moradia, inclusive, fica no local durante alguns períodos do ano.

Eu devia estar com fisionomia de quem quer achar um presente escondido quando Lord me abordou para oferecer seus serviços. Ele é condutor de turismo. Não tem formação na área, contudo, devido ao seu amplo conhecimento histórico acerca da cidade de Olinda acabou ganhando até uma carteirinha profissional. Quando mostrou o crachá, foi logo explicando que não tem estudo. Era menino de rua.

Com doze anos de idade acabou parando numa instituição que atendia crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social. Fez questão de dizer que esse projeto foi uma iniciativa do saudoso bispo Dom Hélder Câmara, por quem sente muita gratidão. Ele conta que, antes disso, também fora acolhido pelos monges que viviam no Mosteiro de São Bento. Ganhava comida e atenção. Foi com eles que aprendeu detalhes da história da cidade. E, graças a isso, hoje é um guia diferenciado que sabe os enredos na ponta da língua, assim como consegue explicar a origem de expressões populares oriundas dessa região do pais.

Lord deixou de ser menino de rua, mas nunca deixou a rua. Há mais de 40 anos, de segunda a segunda, circula a pé pela cidade na companhia de turistas que contratam seu serviço de cicerone. Sorridente, carismático e prestativo, Lord só contou no final do roteiro que, há uma semana, perdeu um dos seus filhos de morte repentina. “Foi um prazer, sempre às ordens, anotem meu contato. Lord, com “d” mudo”, avisou na despedida. Das lições que aprendi, destaco a frase que ele referiu em vários momentos do passeio: “O sol nasce para todos, a sombra é para quem procura”.

Texto por Dirce Becker Delwing, jornalista, psicóloga e psicanalista clínica

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