Quando você ajuda alguém, sua atitude ficará na memória da pessoa, mesmo que passem anos ou décadas

"Talvez você não tenha a menor ideia dos efeitos do seu gesto", comenta a jornalista, psicóloga e psicanalista clínica Dirce Becker Delwing, que conta uma história pessoal para exemplificar seu ponto


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Foto: Divulgação

“Fica sempre um pouco de perfume nas mãos que oferecem rosas, nas mãos que sabem ser generosas”, diz uma música que fazia sucesso na minha infância. Quando você ajuda alguém, mesmo que seja sem a menor intenção de obter algum retorno, você não fica isento de ser lembrado pela sua atitude, mesmo que passem anos ou décadas. Talvez você não tenha a menor ideia dos efeitos do seu gesto. Mas você fez a diferença na história de vida de uma pessoa, de várias pessoas. Para exemplificar a minha fala, conto uma história que aconteceu comigo.

No início da década de 1970, minha mãe me levou a Porto Alegre para corrigir uma deficiência que eu tinha nas vistas. Para que isso acontecesse, ela enfrentou uma longa batalha. Escreveu uma carta de próprio punho, preparou uma cola caseira feita de farinha e água para fechar bem o envelope. O texto era endereçado aos médicos do Banco de Olhos de Porto Alegre. Minha mãe estava pedindo ajuda. Antes dos seis anos de idade, eu precisava fazer uma cirurgia para evitar que perdesse a visão dos dois olhos.

Depois de passado um tempo do envio da carta, devem ter sido muitos os finais de tarde em que ficou acompanhando o ônibus fazer o contorno dos morros na expectativa de que parasse no armazém. A resposta que tanto esperava talvez chegasse pelo correio. Nesse caso, seria entregue pelo motorista do ônibus que vinha da cidade.

 

Não lembro quanto tempo demorou para isso acontecer e como ela prosseguiu investindo na luta. Mas o fato é que, aos meus quatro anos, ela me levou a Porto Alegre para fazer cirurgia de correção de estrabismo. A gente não tinha plano de saúde e nenhum outro benefício que pudesse ajudar nas despesas. Preciso lembrar que tudo isso só foi possível porque minha tia freira, Irmã Noêmia, que hoje mora nos Estados Unidos, reforçou o pedido da minha mãe junto ao hospital para que o procedimento fosse realizado sem custos.

Desde criança, trago comigo o nome do profissional que realizou a cirurgia de forma voluntária. Foram muitas as vezes em que lembrei desse gesto de bondade. Afinal, com a visão restabelecida, segui a vida de forma muito mais encorajada e, especialmente, pude estudar sem maiores dificuldades.

Nunca esqueci do médico, bem possível ele nem lembrasse mais de mim. Mas a vida soube ser ainda mais caprichosa e, depois de passados quase cinquenta anos da realização da cirurgia, tive a possibilidade de agradecer pessoalmente ao Dr. Joaquim José Xavier. Com 76 anos de idade, continua atendendo em seu consultório e realizando cirurgias. Sem dúvida, ele é dessas pessoas que têm mãos perfumadas.

Texto por Dirce Becker Delwing, jornalista, psicóloga e psicanalista clínica

1 comentário

  1. Que linda história. Pessoas do bem que fazem o bem sempre serão lembradas. Muito bonito da sua parte ir conhecer e agradecer o médico. Parabéns!

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