Skatista e empreendedor de SC, Pedro Barros, leva a prata no skate park nas Olimpíadas de Tóquio

O ouro ficou com o australiano Keegan Palmer e o bronze com o norte-americano Cory Juneau


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Foto: Reprodução

Pedro Barros, 26, medalhista de prata nas Olimpíadas de Tóquio no skate park, cresceu em cima de um shape: “Construí uma mini ramp em casa. O Pedro com 11 meses não largava o skate. Antes de começar a andar, ele já ficava em pé no shape se apoiando na parede e andando pela casa”, recorda André Barros, pai de Pedro, que era dono de uma loja de surfe em um shopping de Florianópolis. “Tinha muita conexão com os esportes de prancha. Meu pai aproveitou essa onda”, relembra Pedro, que aos três anos já dropava sobre as quatro rodinhas.

“Em 1996, se não me engano, meu pai foi patrocinador junto com a Drop Dead, que futuramente veio a me patrocinar, de um campeonato profissional na Praia Mole”, diz. Um half de madeira foi montado, e estrelas do esporte no Brasil, como Lincoln Ueda, participaram. “Eu era um bebê, então tem fotos minhas no colo da minha mãe com um ano de idade na plataforma do half”, conta Pedro.

Aos 14 anos, Pedro se tornou profissional e rodava o mundo disputando campeonatos. O adolescente venceu os melhores do planeta no X Games XVI (2010), na Califórnia, o berço do skateboarding, na categoria Park, a mesma que disputará em Tóquio. “Ganhei US$ 50 mil de cara. Era o campeonato que mais dava premiação na época. Nem imaginava que ia ganhar um campeonato daqueles no meu primeiro ano. Eu já tinha ‘zerado’ todas as competições amadoras, ganhado todo o circuito”, orgulha-se.

Nesse mesmo campeonato, Leticia Bufoni, nossa capa digital da edição junho julho, e Bob Burnquist (um dos maiores nomes da história do skate brasileiro e mundial) ficaram com a prata nas categorias Street e Big Air, respectivamente. O novato Pedro foi o único brasileiro com a medalha de ouro no peito naquele ano. E não parou por aí. Hoje, ele ostenta seis primeiros lugares na competição.

“Só não vou falar que o Pedro Barros é sempre uma criancinha, que é coisa que pai fala”, ri Burnquist. “Lembro dele, da primeira interação, vendo-o andar de skate num evento em 2005, acho. Eu estava ali, e a gente falou: ‘vamos ali na pista’”, lembra o veterano sobre o primeiro contato com aquele que alguns anos depois seria alçado ao posto de seu sucessor.

Aos nove anos, interagir com o maior nome do skate no país não parecia assustar Pedro. “A partir do momento em que eu conhecia (algum skatista famoso), eles não eram nada de diferente para mim. Eram pessoas com qualidades e defeitos. Eu não continuava olhando para eles como super-heróis. Isso era pela forma que eles agiam, pelo nível de ser humano que são. Eles se mantêm reais.”

Papel social do skate

A profissionalização aos 14 anos fez com que Pedro Barros não tivesse uma adolescência como os amigos. “Eu pensava: ‘Se eu ganhar de novo ou ficar entre os três primeiros, ganhar o dinheiro que eles pagam, eu compro um carro pra minha mãe, construo meu quarto’. Eram mudanças de vida muito extremas. Isso me dava uma motivação.”

Mas a mudança trouxe consequências: “Eu parei de estudar na 8ª série, porque eu não tinha mais como ir para a escola. Eu precisava viajar o ano inteiro, era o meu ganha-pão. Não tive oportunidade de passar pelo ensino completo”, diz ele que, apesar de não ter finalizado os estudos, afirma ter interesse pelo ensino. “Um dos meus maiores sonhos é fazer um centro de educação para a minha comunidade.”

O pai, André Barros, diz que fez questão de colocar o filho em uma escola pública “para ele entender a sociedade de uma forma mais verdadeira”. A consciência social de Pedro evidencia essa educação. Ele e o pai criaram a LayBack Beer, uma marca de cerveja artesanal, quando o skatista tinha 18 anos, com espaços em Florianópolis, São Paulo, Belo Horizonte, Criciúma e Brasília. “Quando a LayBack nasceu, a primeira atitude foi separar 15 centavos de cada garrafa vendida, que a gente colocava em uma conta e devolvia para o skate de alguma forma. Fizemos reformas de pistas (de skate) públicas em locais de baixa renda, como na Costeira, em Florianópolis, em frente a uma favela”, conta André Barros. Pedro e seu pai também ajudam outros skatistas sem condições de pagar inscrições em campeonatos e viagens.

Depois veio o LayBack Park, espaço na Lagoa da Conceição, com cerveja, gastronomia, lojas e, claro, uma pista de skate, que é aberta ao público. Aliás, essa é uma exigência das parcerias firmadas nas cidades para onde a marca se expandiu. Em alguns dias do ano, 50% da venda de cerveja é revertida diretamente para obras sociais da região.

Para Pedro, skate não é só um esporte, mas uma cultura que pode transformar vidas. “A minha busca com o skate é muito mais respeitar as individualidades e aprender a me aproximar e compartilhar amor, coisas boas. Para que a gente entenda as diferenças um do outro e se una pelas qualidades”, reflete. “(Por causa do skate) sei falar três línguas, tenho experiência de como entrar e sair de vários lugares e países diferentes.”

No dia 20 de maio deste ano, Barros lançou a Privé, uma marca de shapes que ele mesmo constrói “de forma orgânica”, como costuma dizer. Pedro não produz em escala industrial. Faz de acordo com a demanda e a própria vontade ou necessidade. Confecciona e pinta os shapes como um artista e, assim, desafia a indústria. “Eu vivo o skate 100% todos os dias da minha vida. Se tem pessoas que sentem o que falta no nosso mercado são os próprios skatistas, não o empresário.”

Talvez 100% seja exagero. Torcedor do Vasco (“Por incrível que pareça, eu sou de Florianópolis, mas a minha família toda tem um carinho gigantesco pelo Vasco da Gama”), amante da culinária brasileira (“Eu gosto muito de arroz e feijão, farofa, bananinha frita, um cuscuz de manhã, queijo na frigideira, pão com requeijão”), o ainda jovem, mas experiente skatista faz o caminho contrário dos inventores do esporte na Califórnia da década de 60 do século passado, pois vai do asfalto para o mar: “Amo surfar, sou de Floripa. Meu pai surfa. Quando não estava andando de skate, estava sempre surfando”, diz ele, que hoje mora em Los Angeles.

A preparação da seleção brasileira de skate, que reuniu 22 atletas na cidade norte-americana, é considerada inédita para o esporte que ainda sofre com o preconceito e estigmatização. “As Olimpíadas podem trazer uma visibilidade gigantesca. A nossa missão é passar os valores do skate, o que ele tem para agregar dentro da sociedade, o que ele pode ajudar a somar.”

Showtime

Um esporte, para ser considerado olímpico, deve ser praticado em no mínimo 75 países e em quatro continentes, no masculino, e 40 países e três continentes, no feminino. Por aqui, cerca de 2,7 milhões de pessoas andam sobre as quatro rodinhas, ficando na 7ª colocação na preferência brasileira, segundo o Atlas do Esporte no Brasil.

Antes dos Jogos, o site Gracenote, com sua tradicional previsão de resultados, disse que o Brasil conquistaria 20 medalhas no Japão, sendo cinco ouros, colocando nosso país na 17ª posição – por enquanto, a três dias do encerramento dos Jogos, foram 15. O resultado traçado, mesmo que inferior ao da Rio 2016 em termos de colocação (o Brasil ficou em 13º lugar, com sete ouros), daria o recorde de medalhas por conta dos esportes estreantes nos Jogos Olímpicos, como o surfe e o skate. Em qualquer relação de candidatos ao pódio, Pedro Barros aparece. Mesmo após dez medalhas nos X Games, sete campeonatos mundiais e reconhecimento internacional, nada se compara à Olimpíada: “Quando você está representando a bandeira e o povo do seu país, o compromisso torna-se muito maior”.

Ter o skate no programa olímpico propiciou a conquista de verba pública, investimento em novas pistas no país, maior interesse de pessoas andando de skate, Bolsa Atleta e apoio da Confederação. É um avanço para o esporte. Mais do que isso, é a valorização de um modo de viver e ver o mundo: “O skate para mim vai além da competição, do resultado ou da mídia. É o lifestyle.”

Fonte: Globo.com

 

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