Luís Gama, o advogado autodidata e abolicionista que lutou contra a escravização dos corpos negros

Nascido em Salvador no ano de 1830, foi analfabeto até os 17 anos


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Foto: Ilustrativa

Os dados a seguir foram acessados através da pesquisa disponibilizada pelo
Literafro – O portal da literatura Afro-Brasileira, da Faculdade de Letras da
Universidade Federal de Minas Gerais. Nascido em 21 de junho de 1830, em
Salvador, na Bahia. Luís Gonzaga Pinto da Gama, filho de mãe livre, ex-escravizada
e pai branco. Foi analfabeto até os 17 anos. Em 1837, Luiza Mahin deixou a cidade
e partiu em direção ao Rio de Janeiro, ficando o filho aos cuidados do pai. O pai
vivia de uma herança que havia recebido em 1838 e, dois anos depois, já se
encontrava em plena miséria. Em novembro deste mesmo ano, quando Luís, estava
com dez anos de idade, o menino foi levado pelo pai a bordo do navio “Saraiva”, e lá
vendido como escravo.

Por ser baiano, houve certa resistência em sua compra, devido a revolta dos
Malês ocorrida em 1835, na Bahia. Mas foi comprado, e permaneceu neste local até
os 17 anos, quando fugiu. Depois da fuga conseguiu a documentação que
comprovou sua liberdade, uma vez que era filho de mãe livre. E assim começou a
trabalhar. Desenvolveu algumas atividades e em 1854, foi dispensado por ato de
insubordinação, porque havia ameaçado “um oficial insolente” que o insultara.

Devido ao fato, ficou preso por 39 dias. Em 1856, foi nomeado amanuense da
Secretaria da Polícia, onde serviu até 1868, quando foi demitido por “bem do serviço
público”. Para esclarecer o motivo real da demissão, o poeta faz a seguinte
confissão em carta ao amigo Lúcio de Mendonça: A turbulência consistia em fazer
eu parte do Partido Liberal; e, pela imprensa e pelas urnas, pugnar pela vitória de
minhas e suas ideias, e promover processos em favor de pessoas livres
criminosamente escravizadas; e auxiliar licitamente, na medida de meus esforços, a
alforria de escravos, porque detesto o cativeiro e todos os senhores, principalmente
os reis. (Gama, apud Menucci, 1938). Em 1859, Gama publicou Primeiras trovas
burlescas de Getulino, no qual consta o famoso poema “Quem sou eu”, mais
conhecido como Bodarrada, em que expõe o preconceito de cor na sociedade
brasileira. O poema foi escrito em resposta ao apelido que os intelectuais da época
tentaram lhe impor: bode – termo usado de forma depreciativa para designar os
negros mais claros. A respeito desse poema, Brookshaw (1983) faz o seguinte
comentário: “Gama faz abertamente referência a si próprio como negro, dirigindo
sua crítica a todos os descendentes afro-brasileiros que tentavam escapar de sua
origem ocultando-se atrás de uma máscara de falsa brancura”.

Nos anos 1860, o advogado autodidata Luiz Gama se esforçava para tratar
dos casos de escravizações ilegais e de abolições individuais e coletivas do Estado
de São Paulo. A respeito da profissão que abraçava, Gama confessa aos leitores
paulistanos: “Eu advogo de graça, por dedicação sincera à causa dos desgraçados;
não pretendo lucros, não temo represálias”. (Correio Paulistano, 20 de nov. de
1869). Segundo consta, Gama teria sido o responsável direto pela liberdade de
aproximadamente quinhentos escravizados.

Além de advogar, Gama realizava conferências e publicava polêmicos artigos
nos quais explicitava seus ideais abolicionistas, motivos pelos quais era perseguido
e ameaçado de morte. Em um deles, publicado no Correio Paulistano, em
03/12/1869, o poeta discorre sobre a morte de um senhor de terras, pelas mãos de
quatro dos escravos que possuía. Depois do fato, os cativos se apresentaram na
delegacia, e lá teriam sido linchados pela população. Sobre a atitude daqueles que
assassinaram os escravos, ou as “quatro ideias” (como Gama os chama), o poeta
comenta: “Miseráveis; ignoram que o mais glorioso é morrer livre numa forca, ou
dilacerado pelos cães na praça pública, do que banquetear-se com os Neros da
escravidão”.

Liberal exaltado, foi o primeiro negro brasileiro a lutar contra os ideais de
branqueamento da sociedade e pelo fim da escravidão. Mesmo debilitado pela
doença, saía carregado em uma maca, para atender seus clientes desejosos da
liberdade. Faleceu em São Paulo, em 24 de agosto de 1882, deixando uma
emocionante carta-testamento ao filho, que se configura para nós, seus leitores de
hoje, como vivo exemplo de homem público e literato que, mesmo diante das
vicissitudes da vida, não abandona seus ideais.

“Em nós, até a cor é um defeito.
Um imperdoável mal de nascença,
o estigma de um crime.
Mas nossos críticos se esquecem
que essa cor, é a origem da riqueza
de milhares de ladrões que nos
insultam; que essa cor convencional
da escravidão tão semelhante
à da terra, abriga sob sua superfície
escura, vulcões, onde arde
o fogo sagrado da liberdade.”

Luiz Gama
1859

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