“É o custo da democracia”, eles dizem, sobre a drenagem de dinheiro público para campanhas eleitorais

Escritor e polemista de primeira, Olavo de Carvalho falece aos 74 anos. Entenda sua influência no governo e no debate de ideias brasileiro


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Foto: Pablo Valadares / Câmara dos Deputados

Algumas lideranças políticas não desistiram de uma bagatela maior para o fundo eleitoral. Eles se movimentam nos bastidores para aumentar o dinheiro utilizado para irrigar as campanhas deste ano em mais R$ 800 milhões, saltando de R$ 4,9 bilhões para R$ 5,7 bilhões. Há uma pressão para que o governo encaminhe novo projeto com o valor ajustado.

Esse dinheiro público desviado de áreas essenciais, onde o Estado realmente deve atuar, distorce as eleições. “É o custo da democracia”, eles dizem. Nada mais dissimulado como argumento! Esse problema, que é acentuado a cada eleição pelo desejo incessante dos políticos por mais dinheiro para suas campanhas, nasceu lá atrás, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu as doações de empresas às campanhas, em 2015. Foi na esteira das revelações da Lava Jato.

Uma péssima decisão, pois a Corte deveria ter atuado de modo pontual para corrigir distorções, com uma melhor regulação das doações, para dificultar a burla às leis. Porém, o que fizeram foi desequilibrar toda a balança do jogo político-eleitoral. Foi criminalizada a doação eleitoral em vez de ser devidamente punida a corrupção que tanto aflige os brasileiros.

Por que mais distorção? Porque um jovem político que prospere com boas ideias naturalmente chama atenção dos doadores, que investem nele em detrimento de um político veterano que já não cumpre mais o seu papel a contento. A possibilidade de doação de empresas era uma ferramenta que ajudava na alternância de poder, na renovação. O que pode ser mais democrático do que isso?

Com o fundo eleitoral, isso não acontece. O que temos são fatias importantes de recursos públicos represados na mão de líderes políticos. Os caciques usam para si e os seus. Se o candidato tiver boa relação com os líderes, cantar a mesma música, assoviar o mesmo assovio, falar a mesma língua, tiver os mesmos vícios, é provável que tenha mais recursos para sua campanha. Nessa composição, se houver renovação, é uma renovação que nasce velha, com antigos vícios de cara nova.

O fundo eleitoral barra a renovação e representa a volta ao coronelismo de décadas atrás. O que pode ser mais antidemocrático do que isso? Nada pode ser pior do que a estabilidade que damos aos políticos. Seja com mandatos de 4 anos, seja com a garantia de financiamento totalmente desproporcional entre quem tem mandato e os novos entrantes.

A morte de Olavo

O escritor e professor de filosofia Olavo de Carvalho morreu na noite da última segunda-feira (24), aos 74 anos. A notícia foi comunicada pela família nas redes sociais de Olavo. Ele estava hospitalizado na região de Richmond, no estado da Virgínia (EUA). O fato reativou as discussões sobre a relevância do autor no debate político nacional.

Olavo foi uma figura central no processo eleitoral de 2018, tratado como guru do presidente Jair Bolsonaro. Essa afirmação é um certo exagero, na verdade. Por outro lado, ele foi uma grande influência ideológica para vários grupos quando ainda não existia uma organização e reconhecimento maior da direita no Brasil. O escritor sempre alertava para a ocupação de espaços no debate público, na academia, no jornalismo, na burocracia estatal da esquerda e da social-democracia. Por outro lado, constatava que movimentos conservadores e liberais, antagonistas à esquerda, não estão presentes no Brasil de modo organizado como em democracias consolidadas.

Escritor é mais conhecido pelo “O Mínimo Que Você Precisa Saber Para Não Ser Um Idiota” (Foto: Reprodução)

Olavo vinha quebrando esse silêncio do seu jeito polêmico. Ele era um polemista de primeira, tanto que acumulou processos ao longo da vida pública, fato que o levou a sair do Brasil, em direção aos Estados Unidos. O escritor foi uma das principais vozes na denúncia aos desmandos e aos episódios de corrupção do PT, o que foi reforçado com as investigações na Operação Lava Jato. Olavo também voltava seu foco ao Foro de São Paulo, por onde a esquerda latino-americana se organiza. O professor foi o primeiro a apontar esse dado da realidade e a mobilizar grupos de direita pela internet.

Depois de sair dos grandes veículos, onde publicava artigos regularmente, ele descobriu um novo nicho de mercado no mundo digital, o que o tornou um sucesso editorial nas livrarias. Muitos conheceram autores até então sonegados na academia, na imprensa e nos círculos intelectuais por meio de Olavo e a partir daí, militaram à direita.

Em 2018, o presidente e vários políticos liberais e conservadores que ascenderam apontavam Olavo de Carvalho como influência e referência. Ele se tornou uma figura popular. Muitos que até então não tinham lido nenhuma obra do autor desenvolveram ódio a ele por sua ligação com Bolsonaro. E por outro lado, também tem aqueles que prestam deferência como uma figura mítica.

Olavo tem alunos e admiradores no governo Bolsonaro; na foto um encontro nos EUA entre o escritor, o presidente e seu filho Eduardo (Foto: Reprodução / Twitter)

Particularmente, penso que um personagem público deve ser lido, analisado, elogiado e criticado por suas ideias e obras, e não por espantalhos que constroem, ou por sua proximidade com políticos.

Como polemista, ele adotou em dados momentos uma postura beligerante e revolucionária, o que fez com que vários alunos ou admiradores de sua obra se distanciassem do professor.

Olavo foi bastante influente, principalmente no começo do governo Bolsonaro. Indicou dois ministros da Educação (Ricardo Vélez Rodríguez e Abraham Weintraub) e o primeiro titular das Relações Exteriores do presidente, Ernesto Araújo. Recentemente, o escritor estava se vendo em meio à críticas ao presidente. Olavo cobrava pelo abandono da agenda que elegeu Bolsonaro em 2018 e a aproximação do presidente com o Centrão.

Texto por Douglas Sandri, graduado em Engenharia Elétrica, é presidente do Instituto de Formação de Líderes (IFL) de Brasília e assessor parlamentar. Todas as quartas-feiras, participa do quadro “Direto de Brasília”.

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