“Fazer alguma coisa” para reduzir o preço dos combustíveis “na canetada” é contratar um problema maior ali na frente; entenda

Saídas heterodoxas como a “PEC Kamikaze” só vão piorar, com aumento da dívida pública e mais inflação. A solução passa por fazer o trabalho de base, com uma revisão profunda do sistema tributário para reduzir a pressão dos impostos


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A elevação dos preços afeta a todos nós. Em meio à pandemia de coronavírus, com as cadeias produtivas afetadas, Brasil e o mundo todo lidam com inflação em alta. Em nosso país, o poder de compra do consumidor registra queda em relação ao ano anterior devido à inflação superior a 10%. No caso dos combustíveis, a situação é agravada em função da alta concentração de carga tributária em cima, o que torna ainda mais necessária uma reforma tributária.

Em Brasília, o Centrão, grupo político que dita a pauta do Congresso e do governo atualmente, pressiona para que seja adotada alguma medida, seja ela qual for, para reduzir a pressão dos combustíveis no bolso do consumidor. E como o Centrão também assumiu as rédeas do Planalto em meio à busca do presidente pela reeleição, os líderes entendem que é fundamental para o governo fazer algo para tentar minimizar a rejeição ao presidente. Mesmo que Bolsonaro, por si só, não seja o único responsável pelo problema, a conta sempre cai no colo do governante de plantão.

Na esteira dessa discussão surgiu uma proposta que a equipe econômica chama de “PEC Kamikaze”, com o senador Flávio Bolsonaro como um dos proponentes, para reduzir impostos nos combustíveis e dar auxílio a caminhoneiros na compra por diesel. No atual momento de crise econômica e rombo fiscal, é um contrassenso, pois os cálculos indicam para um custo de R$ 100 bilhões para a União. Lá na frente, esse encargo retornará à população na forma de inflação. Traduzindo: mais alta generalizada de preços.

Engenheiro, presidente do IFL Brasília e assessor parlamentar, Douglas Sandri analisa os fatos políticos de Brasília na programação da Rádio Independente (Foto: Divulgação)

Tem outra questão de princípios: simplesmente baixar impostos sem cortar despesas de um Estado grande, inchado e mastodôntico não produz os efeitos desejados, pois vira dívida pública, componente que pressiona a inflação novamente para as alturas. Seria apagar o fogo com gasolina. Medidas heterodoxas na canetada, dispensando o trabalho virtuoso de base (reformas, corte de despesas e abertura de mercado) é contratar um problema gigante.

O governo devia focar suas energias em alavancar a PEC 110, que tramita no Senado. Essa, sim, é uma reforma tributária robusta, capaz de desconcentrar tributos sobre os combustíveis e fazer com que todo mundo pague um pouco e pague menos impostos. Como está hoje, vemos que a União e os governos estaduais batem recordes de arrecadação enquanto a população passa dificuldades para fechar as suas contas mês após mês.

A conversa fiada está de volta, e com dinheiro público

O Congresso derrubou nesta terça-feira (8) o veto do presidente Jair Bolsonaro (PL) à compensação fiscal para emissoras de rádio e TV pela propaganda partidária. Dessa forma, as emissoras terão direito a abaterem parte dos valores que ganhariam caso o espaço fosse pago pelos partidos. Quer dizer: é a volta da propaganda partidária com dinheiro público. Somente no primeiro semestre deste ano, o valor das inserções será de R$ 2,8 bilhões.

Quando foram criados, os fundos partidário e eleitoral surgiram com a desculpa de que seriam usados recursos justamente do fim da propaganda partidária, que nada mais é do que uma conversa fiada muito tempo antes das eleições que servem para projetar alguns integrantes dos partidos políticos no rádio e na TV.

Foto: TSE / Reprodução

Com a volta da propaganda partidária, ficou um limbo do qual os caciques partidários se aproveitam. A ideia era que os partidos e os candidatos adquirissem esses espaços de forma voluntária, mas, na tramitação, o texto foi reformado e a aquisição se tornou obrigação, como era antes. Bolsonaro vetou o benefício fiscal, mas o Congresso derrubou e fez valer a sua vontade. Se é para voltar, então que essa compensação saia do caixa dos fundos partidários e eleitoral, e não dos cofres da União. Seria algo muito mais palatável a uma população já reticente à política.

Texto por Douglas Sandri, graduado em Engenharia Elétrica, é presidente do Instituto de Formação de Líderes (IFL) de Brasília e assessor parlamentar. Todas as quartas-feiras, participa do quadro “Direto de Brasília”.

 


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