Estava num centro de formação de condutores aguardando um procedimento e escutei o atendimento ao lado. Um senhor buscava informações sobre a renovação de sua carteira de motorista de uso profissional. Como estava prestes a vencer, ele queria tentar o máximo de agilidade. Foi informado que precisava passar por um exame de sangue toxicológico antes de encaminhar as demais etapas. Ele tentou verificar se haveria tempo hábil de fazer todos os procedimentos e não perder trabalho em razão da carteira vencida, então perguntou a ela quantos dias levaria para o exame de sangue ficar pronto. Ela respondeu que não sabia, e encerrou por ali a conversa.
Fiquei pensando na má vontade da moça. Alguém que trabalha diariamente com isso não tem noção de quanto tempo demora um exame toxicológico? Além de ter essa informação, ela bem que poderia oferecer um papel com os nomes dos laboratórios e contatos, o que ajudaria muito as pessoas que por ali circulam.
Pode ser que eu tenha presenciado apenas um recorte de uma história, e que aquela moça só estava num dia ruim. Por essa razão, opto por dirigir minha reflexão não para ela, mas para esse tipo de situação, que encontramos diariamente por onde circulamos.
A falta de vontade de ajudar, a desatenção e o descaso com o outro estão por toda parte. E os motivos que justificam esse tipo de comportamento são os mais diversos, desde características pessoais até insatisfações profissionais. Mas e aí, qual a alternativa? Aceitar e seguir reproduzindo as mesmas formas de agir ou buscar alternativas que modifiquem o cenário?
Pode até ser que alguém diria, “ah, o sentido que vejo em meu trabalho é ganhar dinheiro para viver”. Tá bem, pode ser, mas uma coisa não precisa excluir a outra. Você pode enxergar seu trabalho como um meio e não como um fim, mas ainda assim pode torná-lo leve se conseguir ampliar um pouco sua rede de significados. E para isso, não existe receita, cada um deverá buscar esses sentidos a partir de suas reflexões e experimentações.
Há uma afirmação do escritor e filósofo russo Dostoiévski que diz: “Ocorreu-me certa vez o pensamento de que se alguém quisesse arruinar e destruir totalmente um homem, infligindo-lhe o castigo mais terrível, algo que fizesse tremer o mais cruel assassino e o levasse a se encolher por antecipação, bastaria obrigá-lo a dedicar-se a um trabalho absolutamente desprovido de utilidade e sentido.”
Texto por Tamara Bischoff, jornalista e psicóloga
