Morador de abrigo em Lajeado aprendeu a ler aos 45 anos; aos 56 já leu cerca de 500 livros e sonha em fazer faculdade

“O dia que eu não leio é a mesma coisa que não comer”, diz Altemar Pires que já foi morador de rua e perdeu a casa na enchente de maio. Ele possui atraso mental e fibromialgia


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Altemar Alberto Pires e seus livros no abrigo de Lajeado (Foto: Gabriela Hautrive)

Aos 56 anos, Altemar Alberto Pires enfrenta desafios desde que nasceu, mas nenhuma dificuldade foi suficiente para tirar sua vontade de conquistar objetivos pessoais. Morando em um abrigo, no Parque do Imigrante, em Lajeado, desde que perdeu a casa por conta da enchente no início de maio, onde residia com a irmã, ele faz questão de ler pelo menos dez páginas de algum livro todos os dias.

Pires aprendeu a ler com 45 anos, e desde então, já leu cerca de 500 exemplares, dos mais variados assuntos, mas seus preferidos, são aqueles sobre coisas abstratas, principalmente religião e natureza. Grande parte da vida de Altemar Pires foi morando na rua e buscando por sua família biológica, na qual conheceu quando tinha 20 anos.

Com apenas o ensino fundamental, ele ainda sonha em um dia fazer uma graduação. “Eu sonho em estudar ainda, eu sonho me formar. Eu sempre tive um sonho de ser um coreógrafo. Quando eu era adolescente, eu era criança, eu tive o sonho de ser delegado federal. Agora é coisa quase impossível, mas ainda não é impossível, porque para Deus nada é impossível. Então, mediante isso, eu leio todos os dias. E o sonho é uma coisa que ele não está em ação, mas ele está em mim”, destaca.

Seus livros preferidos são os religiosos e os tratam sobre natureza (Foto: Gabriela Hautrive)

Segundo Pires, mesmo aprendendo a ler já adulto, a leitura mudou sua vida. “Ninguém tem alguma profissão, não existe um médico, sem ter uma boa leitura, sem passar pela mão de um professor. Então, aprender a ler e escrever foi fundamental para mim, para a minha intelectualidade, para o meu conhecimento e desenvolvimento. Nos dias de hoje, o dia que eu não leio é a mesma coisa que não comer. Isso eu venho desde criança com vontade de ler, aprender a ler, escrever, e hoje, graças a Deus, a minha intelectualidade mudou bastante”, pondera.

Por um trauma de infância, Altemar teve problemas para aprender a ler. Chegou a frequentar a escola quando criança, mas seu atraso mental dificultou o processo. Depois de adulto, passou por quatro escolas, até conseguir ler a primeira palavra, que foi “fênix”. Além da graduação, ele projeta escrever sua própria biografia.

Vendedor de rapaduras e busca por um lar

Mas antes de voltar a estudar, Altemar Pires quer achar um lugar seguro para morar. Uma casa em que ele não precise sair todas as vezes que chove por conta da enchente. “Num lugar estável, num lugar onde não tem tanta correria, um lugar calmo, que eu consiga voltar a estudar. Quero ainda fazer uma faculdade. Tenho o sonho de fazer uma faculdade. E esse é o sonho que não vai morrer dentro de mim, e quando eu conseguir voltar a estudar, eu vou estar tão preparado psicologicamente”, comenta.

Pires está no abrigo desde a enchente de maio (Foto: Gabriela Hautrive)

Além do atraso mental, ele possui a doença de fibromialgia, que causa dor muscular, e impede que Pires faça algumas atividades. Por conta disso, atualmente ele não possui nenhuma renda fixa e trabalha vendendo rapaduras, que ele mesmo produz. Mesmo em condições difíceis e sem casa para morar, Pires não vê motivos para reclamar. “Estou muito feliz, eu fui muito bem tratado, as mulheres são muito queridas aqui, inclusive eu tenho um amigo meu, que eu chamo de amigo, que é um médico, que me deu seis livros”. Altemar Pires morou por muitos anos em Encantado, e outros municípios da região alta do Vale do Taquari. Desde 2022 está residindo em Lajeado.

 

Texto: Gabriela Hautrive
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