“Cada dia que passa é uma vitória” afirma mestre Karcará sobre a disseminação da cultura africana numa região de colonização europeia

Professor de capoeira fala sobre invisibilidade social e o legado deixado pelos negros escravizados


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Mestre Karcará (Foto: Fernanda Kochhann)

Mais conhecido como mestre Karcará, Paulo Renato Narciso é professor de capoeira com uma trajetória marcante no Vale do Taquari. Nascido em Porto Alegre, ele se considera “baiúcho” de coração. Isso porque passou boa parte de sua vida em Salvador, onde teve um contato profundo com a cultura de seus antepassados e com a negritude. Esse período foi crucial para despertar seu sentimento de pertencimento às raízes culturais, Também foi lá que ele aprendeu a capoeira, uma arte marcial afro-brasileira que se tornou sua paixão.

A capoeira tem uma história intrínseca à resistência dos negros escravizados, que a utilizavam os golpes como forma de autodefesa. Desse contexto, surgiram os movimentos que deram origem à capoeira, tornando-se um instrumento de libertação.

Karcará explicou que os escravos praticavam os movimentos nas senzalas, mas quando os senhores do engenho ou capatazes se aproximavam, eles disfarçavam a luta em movimentos de gingado e dança, evitando punições. Por isso, o mestre considera que “a capoeira foi o alicerce da liberdade dos escravos”.

Com cerca de 30 anos de atuação, Karcará teve uma passagem pela Europa, ensinando capoeira, mas decidiu voltar ao Brasil e, em 1994, se estabeleceu definitivamente em Lajeado. Desde que chegou à cidade, o mestre enfrentou o preconceito devido às suas características físicas e culturais. Seus cabelos volumosos e sua origem afro-brasileira foram motivo de “olhares tortos pelas ruas”, sobretudo em uma região de forte presença de descendentes de colonização europeia.

Apesar da invisibilidade social que sentiu desde o início, seu trabalho na capoeira foi bem recebido, atraindo alunos de diversas origens interessados em aprender a arte e a cultura afro-brasileira.

Foto: Reprodução/Facebook

Ao longo de sua carreira, Karcará acredita ter contribuído significativamente para a formação e desenvolvimento de muitas pessoas, especialmente jovens. Sua atuação foi além do ensino da capoeira, pois ele buscou orientar os alunos, afastando-os do caminho das drogas e oferecendo afeto e cuidado às crianças que enfrentavam problemas afetivos.

Para mestre Karcará, levar a cultura africana para uma região com forte influência europeia foi uma jornada repleta de desafios. “Cada dia é uma vitória” na luta contra o preconceito e a discriminação. Mesmo com cicatrizes deixadas pelas adversidades enfrentadas, ele encontra forças para continuar difundindo o legado da capoeira e promovendo o respeito à diversidade cultural.

Texto: Fernanda Kochhann
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