Do resto a gente corre atrás

No quadro Um outro olhar, uma reflexão para os desejos de Ano Novo


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Ivete Kist (Foto: Fernanda Kochhann)

Uma das mensagens mais conhecidas de Ano Novo é aquela que faz votos de boa saúde e acrescenta, logo em seguida, que do resto a gente corre atrás. Quem não ganhou uma mensagem assim na passagem para 2024?

Bem legal fazer votos de saúde. Quando falta saúde, tudo o mais se complica. Ninguém tem dúvida a respeito. Mas há uma coisa intrigante nessa mensagem… Parece que está embutida aí uma ideia de milagre em relação à saúde.

É como se saúde fosse uma dádiva dos céus, tipo uma loteria que a gente estaria torcendo para ganhar. Tipo um presente que chega embrulhado em papel colorido. É abrir e correr pro abraço.

A verdade nua e crua é diferente. Pena!

A verdade é que a saúde não vem de graça. A saúde é exatamente o bem do qual a gente tem de correr atrás com mais esforço. Saúde a gente faz por merecer. Melhor se a mensagem de Ano Novo viesse modificada. Algo como fazer votos de tudo de bom, desde que você corra atrás da saúde.

Se pensarmos bem, vamos ver que a saúde está na base de quase todas as promessas de Ano Novo que fazemos e, muito provavelmente, está igualmente entre aquelas metas que vamos ter dificuldade para cumprir (aliás, estudos dizem que deixamos de cumprir 88% das nossas promessas…) O caso é que não é fácil cuidar da saúde. Fazer exercícios; alimentar-se adequadamente; dormir bem; dedicar mais atenção aos afetos e aos temas imateriais; cultivar a paz interior… são assuntos que fazem bonito na lista do metas para o ano, mas concretizá-los no dia a dia é uma pedreira.

Veja-se o caso dos exercícios físicos. Não adianta comprar todos os apetrechos para correr, não adianta pagar a mensalidade da academia. A única coisa que funciona é o empurrão na preguiça e a tolerância para suportar o esforço e ao suor. Seja com a roupa da moda ou com a camiseta mais surrada do guarda-roupa, a exigência é igual.

Veja-se o caso da alimentação. Alguém aí tem dúvida sobre as vantagens de evitar os produtos empacotados, prontos para consumir e, no lugar disso, ir para a cozinha preparar a própria comida? Alguém aí desconhece o benefício de uma dieta rica em frutas e verduras, com pouco açúcar e poucas gorduras saturadas?

A gente sabe que a boa saúde é uma resultante de cuidados com a saúde do corpo e da alma. A gente sabe que as amizades profundas e boas fazem tanto bem como os remédios (ou mais). A gente sabe que cuidar da saúde é uma tarefa gigantesca, complexa, pessoal e intransferível. O que nos falta não é informação.

Falta o quê, então?

No próximo final de ano talvez possamos desejar que não falte a gana de correr atrás da saúde. Exatamente por que – ao contrário do que parece – havendo saúde, todo o resto virá por acréscimo.

Texto por Ivete Kist, professora e escritora

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