Fanatismo: as guerras são amadas pelos homens

Quais os riscos de tomarmos partido ao interpretarmos os conflitos


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Foto: divulgação/Israel Defense Forces

A escalada no conflito que está ensanguentando o Oriente Médio causa apreensão em todo o mundo. Não bastasse isso, prossegue a guerra entre Rússia e Ucrânia e há ainda guerras menos “famosas”, digamos assim. É o caso da guerra entre Armênia e Azerbaijão e de escaramuças internas na Etiópia.

Parece que Affonso Romano de Sant’Anna, intelectual carioca, tem toda a razão em dizer num poema seu: “Os homens amam a guerra. Não há perigo de paz”. O poema foi publicado na época em que transcorria a guerra das Malvinas, entre Argentina e Inglaterra, em 1982. Se ele fosse vidente, não teria acertado melhor…

Em nosso país, há o risco de “abrasileirar” o conflito. Quero dizer, o risco é tomarmos partido e começarmos a interpretar a guerra dos outros com os nossos instrumentos. O risco é misturar as dificuldades de convivência dos povos com as nossas simpatias ou ideologias. Juntar a isso dados da política nacional e produzir, por fim, fórmulas ao gosto dos antigos filmes de farwest. Ou seja, queremos defender o mocinho, para fulminar os bandidos de uma vez por todas.

As simplificações são arriscadas

Infelizmente a fórmula pão-pão-queijo-queijo não funciona muito bem, quando se trata de relações humanas.

Vale lembrar aqui o intelectual israelense Amós Oz (1939 – 1918). O primeiro ensaio do livro intitulado “Mais de uma luz” procura distinguir fanáticos de fanatismo. Lembra que o mais difícil de tudo é lidar com o fanatismo.

Amós Oz diz que o fanatismo se manifesta no mundo desde tempos remotos e sob as justificativas mais diversas. Nem pátria, nem religião nem família ficam sem culpa. O fanatismo está mais espalhado do que gostamos de reconhecer. Falar sobre o tema, identificar os sinais, é a melhor forma de espantar esse fantasma que ronda permanentemente e em todas as geografias.

O fanatismo dá as caras, quando temos certeza do que deve ser feito e nos sentimos na obrigação de convencer todos os outros de que nosso caminho é o único possível. O fanatismo ignora a dificuldade das situações e oferece uma solução simples, que resolverá qualquer contenda de um só golpe e que nos livrará do todo o mal, amém. O fanatismo é uma certeza “sem portas nem janelas”, compara Amós Oz.

O fanatismo aparece na ânsia de mudar o outro, para que não existam os diferentes nem a diferença. O fanatismo força todos a pensar e a agir de forma igual. Não consegue ver a contribuição do pensamento dissonante.

O fanatismo ignora o prazer da diversidade. O fanatismo não reconhece o direito de inventar uma forma própria de viver. O fanatismo não sabe que, no lugar onde mora toda a razão, as flores não nascem.

Vale pensar no assunto.

Texto por Ivete Kist, professora e escritora

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