Quando a dor precisa transparecer

Vini Jr. se emociona ao falar de sua luta contra o racismo dentro e fora das quatro linhas.


0
Vini Jr (Foto: CBF/Divulgação)

A dor física pode ser compreendida pela maior parte das pessoas, mas a dor de sofrer um ato racista, só vai ser sentida e entendida por quem é negro. Além do corpo negro carregar um alvo no peito, ou nas costas, por sermos os corpos mais atingidos por balas policiais, ainda precisamos lidar com as agressões sofridas diariamente, pelo simples fato de conviver em sociedade. E por essa sociedade insistir que as pessoas negras são inferiores ou menos capazes de adquirir conhecimento. No entanto, mesmo que as pessoas brancas, não possam sentir ou compreender a dor de um ataque racista, é importante que se responsabilizem pela
sua parte e obrigação na luta antirracista, e assim sejam aliados nesta luta tão árdua e solitária. Como tem sido a caminhada de Vini Jr. na Espanha. O jogador tem sofrido uma série de ataques racistas, e pouco tem se visto, de movimentações e ações, por parte das autoridades, o que reforça a importância de se ter aliados nesta caminhada, porque por mais que o jogador faça denúncias e pedidos de justiça, não é verificada nenhuma sanção jurídica ou cível, aos clubes, ou torcedores, responsáveis por estas violências.

Por isso, o choro de Vini Jr. na coletiva de imprensa onde estava representando a seleção brasileira, é tão doloroso, e comovente. Porque ele sabendo de toda a relevância e poder que tem, e ver que mesmo assim, os seus agressores não estão sendo punidos, facilmente imagina o que acontece quando as vítimas são pessoas simples, e humildes, que precisam se manter subordinadas, e muitas vezes caladas diante de uma situação de racismo, para que mantenham seu emprego. E esse cenário se conecta com uma reflexão feita por Sueli Carneiro, no dia do combate a discriminação racial (21/03) “Somos seres humanos como os demais, com diversas visões políticas e ideológicas. Eu por exemplo, entre esquerda e direita, continuo sendo preta”. E isso faz com que diariamente a gente seja lembrado, independente de quem formos, do cargo que ocupamos, das ideias que defendemos, ou antes de qualquer título, o que chega nos lugares primeiro é a cor da nossa pele.

E enquanto não tivermos aliados brancos, nesta luta, infelizmente não teremos mudanças, porque os juízes são majoritariamente brancos, os policiais que registram as ocorrências, são majoritariamente brancos, os policiais que investigam os acontecimentos, são majoritariamente brancos, e se estas pessoas, e a sociedade civil, não tomarem consciência da relevância dos seus atos, para punir esses criminosos, continuaremos vendo o choro de jovens, que mesmo com suas carreiras profissionais estabilizadas e consolidadas deveriam apenas sorrir, mas são atravessados por esse crime, que muitos ainda lutam pelo direito de cometer.

Sigamos sendo Vinicius Junior, por onde formos! Resistentes, mas também humanos o suficiente para chorarmos quando a dor precisar transparecer. Para que talvez assim, vendo as nossas lágrimas e o nosso suor a sociedade entenda, que é culpada de ainda precisarmos lutar tanto, pelo mínimo de respeito e dignidade.

Texto por Nadini da Silva, advogada e mestranda em Ambiente e Desenvolvimento

DEIXE UMA RESPOSTA

Digite seu comentário!
Por favor, coloque o seu nome aqui